É um chamado: nossas crianças precisam de atenção. E são elas mesmas que nos dizem isso. Querem ser ouvidas e têm opiniões fortes e surpreendentes sobre os principais assuntos do nosso tempo. Não estão, por exemplo, nada contentes com o mundo que estamos deixando para elas. Têm consciência do que vem causando desastres ambientais, desigualdade social, guerras e a violência que permeia nossas relações. Também são críticas quanto à escola que é oferecida para elas e sabem que exageram no tempo que dedicam à internet e aos eletrônicos em geral. E talvez o mais preocupante: elas têm muita clareza dos impactos negativos que tudo isso causa a elas e ao futuro da humanidade. “A infância está sendo amputada”, diz o pediatra Daniel Becker.
Tais conclusões são resultado de uma pesquisa etnográfica inédita realizada com meninos e meninas da capital de São Paulo e que é o ponto de partida para o projeto O mundo que sei, um panorama do nosso tempo traçado pelo olhar e a voz das crianças. Ao longo de dois meses, uma equipe liderada pela antropóloga Adriana Friedmann se dedicou a ouvir em profundidade, por meio da metodologia de escuta sensível, 170 crianças de 6 a 12 anos, de cinco localidades diferentes. Os achados serviram de base para a criação dos outros conteúdos que fazem parte de OMQS: uma série documental e um podcast (por enquanto, ainda vem muita coisa pela frente!).
A reportagem a seguir é resultado desta escuta, mas não só. Faz parte de O mundo que sei também uma pesquisa quantitativa, que consultou 1.000 mães, pais e cuidadores em todo o território nacional. Além disso, ao longo de todo o processo de construção dos conteúdos, o material elaborado e colhido foi cuidadosamente acompanhado por uma equipe de especialistas em diversas áreas – educação, pediatria, psicanálise, arquitetura e urbanismo e audiovisual – que compõem o conselho consultivo do projeto. Trata-se de um convite à reflexão, à abertura de diálogo e ao exercício de criação de propostas e ações para a construção de um mundo melhor.
É hora de escutar as crianças
É um chamado: nossas crianças precisam de atenção. E são elas mesmas que nos dizem isso. Querem ser ouvidas e têm opiniões fortes e surpreendentes sobre os principais assuntos do nosso tempo. Não estão, por exemplo, nada contentes com o mundo que estamos deixando para elas. Têm consciência do que vem causando desastres ambientais, desigualdade social, guerras e a violência que permeia nossas relações. Também são críticas quanto à escola que é oferecida para elas e sabem que exageram no tempo que dedicam à internet e aos eletrônicos em geral. E talvez o mais preocupante: elas têm muita clareza dos impactos negativos que tudo isso causa a elas e ao futuro da humanidade. “A infância está sendo amputada”, diz o pediatra Daniel Becker.
Tais conclusões são resultado de uma pesquisa etnográfica inédita realizada com meninos e meninas da capital de São Paulo e que é o ponto de partida para o projeto O mundo que sei, um panorama do nosso tempo traçado pelo olhar e a voz das crianças. Ao longo de dois meses, uma equipe liderada pela antropóloga Adriana Friedmann se dedicou a ouvir em profundidade, por meio da metodologia de escuta sensível, 170 crianças de 6 a 12 anos, de cinco localidades diferentes. Os achados serviram de base para a criação dos outros conteúdos que fazem parte de OMQS: uma série documental e um podcast (por enquanto, ainda vem muita coisa pela frente!).
A reportagem a seguir é resultado desta escuta, mas não só. Faz parte de O mundo que sei também uma pesquisa quantitativa, que consultou 1.000 mães, pais e cuidadores em todo o território nacional. Além disso, ao longo de todo o processo de construção dos conteúdos, o material elaborado e colhido foi cuidadosamente acompanhado por uma equipe de especialistas em diversas áreas – educação, pediatria, psicanálise, arquitetura e urbanismo e audiovisual – que compõem o conselho consultivo do projeto. Trata-se de um convite à reflexão, à abertura de diálogo e ao exercício de criação de propostas e ações para a construção de um mundo melhor.
O que dizem as crianças
Eu acho que eu mudaria muitas coisas se eu pudesse. Começaria mudando o jeito como as pessoas são. Eu mudaria a economia, porque tem pessoas que são muito, muito pobres e não conseguem comer, enquanto tem pessoas que têm muito dinheiro e não precisam desse dinheiro. Eu daria esse dinheiro para as pessoas que precisam.
Meu sonho… meu sonho é ser rico. O homem mais rico do mundo. Eu quero ter um patrimônio que nem mesmo os homens mais ricos do mundo, até agora, têm. O patrimônio de um rei. [Se eu tivesse esse dinheiro], acabaria com a fome, comprando comida para todo mundo.
O único planeta que temos nós estamos destruindo. Por ganância, poder.
Eu colocaria a aldeia e a cidade junto porque, aí, ninguém mais brigaria por terra.
Família? É isso: simplesmente eu não quero.
Violência é tanto agressão física como verbal, que pode machucar por dentro da pessoa ou por fora. A agressão também pode machucar os sentimentos. Aí a pessoa pode se sentir triste.
Amor é quando uma pessoa melhora a vida da outra.
Machismo é injustiça porque os homens tratam as mulheres mal.
Toda criança tem o direito de ser amada, mas muitos pais não amam os filhos de forma correta.
Homofobia é muito pior do que preconceito.
Meu irmão não brinca mais de carrinho porque só fica no celular. Não tem mais brinquedo no quarto dele.
O mundo mudou muito. Tem tecnologia, tem telefone celular, tem outras fontes, mas a escola não muda. Está sempre a mesma coisa!
Comunidade indígena Guarani Tekoa Pyau
famílias habitam, somando cerca de 370 pessoas
participaram da pesquisa
- Fundada em 1992
- Tipo de instituição aldeia indígena reconhecida pela FUNAI
- Bairro Jaraguá
- Zona Norte
EMEF Amorim Lima
crianças atendidas
participaram da pesquisa
- Fundada em 1956
- Tipo de instituição escola pública
- Bairro Butantã
- Zona Oeste
Wish School
crianças atendidas
participaram da pesquisa
- Fundada em 2008
- Tipo de instituição escola particular
- Bairro Tatuapé
- Zona Leste
Lar das Crianças
crianças atendidas
participaram da pesquisa
- Fundada em 1937
- Tipo de instituição contraturno escolar, iniciativa filantrópica
- Bairro Alto da Boa Vista
- Zona Sul
Comunidade Horizonte Azul
crianças atendidas
participaram da pesquisa
- Fundada em 1983
- Tipo de instituição contraturno escolar, iniciativa pública
- Bairro Jardim Angela*
- Zona Sul
O que dizem os pais
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Além de ouvir as crianças, OMQS, em parceria com o Studio Ideias, foi a campo para saber o que pensam e com o que se angustiam as mães e os pais de meninos e meninas com entre 6 e 12 anos. A investigação partiu de entrevistas com dez pessoas neste perfil. Foram elas e os resultados da pesquisa etnográfica realizada com meninos e meninas da capital de São Paulo que deram o norte para a construção de um formulário composto por 40 questões e distribuído em todo o território nacional. Ao final, foram colhidas respostas completas de 1.000 pessoas. Confira a seguir alguns dos principais achados.
Família
70
%
49
%
De olho no nosso tempo
31
%
33
%
Meio ambiente
8
%
13
%
Mundo virtual como desafio
81
%
29
%
Saúde mental em foco
80
%
36
%
Violência como linguagem
62
%
60
%
O que dizem os pais
Além de ouvir as crianças, OMQS, em parceria com o Studio Ideias, foi a campo para saber o que pensam e com o que se angustiam as mães e os pais de meninos e meninas com entre 6 e 12 anos. A investigação partiu de entrevistas com dez pessoas neste perfil. Foram elas e os resultados da pesquisa etnográfica realizada com meninos e meninas da capital de São Paulo que deram o norte para a construção de um formulário composto por 40 questões e distribuído em todo o território nacional. Ao final, foram colhidas respostas completas de 1.000 pessoas. Confira a seguir alguns dos principais achados.
Família
70
%
49
%
LEIA DEPOIMENTOS
De olho no nosso tempo
31
%
33
%
LEIA DEPOIMENTOS
Meio ambiente
8
%
13
%
LEIA DEPOIMENTOS
Mundo virtual como desafio
81
%
29
%
LEIA DEPOIMENTOS
Saúde mental em foco
80
%
36
%
LEIA DEPOIMENTOS
Violência como linguagem
62
%
60
%
LEIA DEPOIMENTOS
O que dizem os especialistas
Durante todo o processo de pesquisa e análise de dados, a equipe de O mundo que sei foi amparada por um seleto grupo de especialistas. Em reuniões presenciais e online, entrevistas individuais e muitas trocas de emails, mensagens e telefonemas, o grupo contribuiu com seu olhar cuidadoso e expertise de quem tem décadas de trabalho com crianças. Veja quem são e confira algumas das suas principais observações.
Nem vou falar só sobre a pandemia, mas questões de depressão e até suicídio têm surgido. Sinto que mudou muito, elas estão sendo empurradas para aquilo que a sociedade quer delas. A minha intuição é de que isso terá consequências muito sérias. É uma geração em que tudo é muito planejado, cada dia, cada dia de férias, também em função das nossas vidas adultas.
ADRIANA FRIEDMANN
Pedagoga, mestre em Educação e doutora em Antropologia, atua há 40 anos como formadora, pesquisadora e consultora junto a fundações, ONGs, escolas, universidades e secretarias de educação, cultura e saúde, com foco na escuta de crianças.
As crianças vivem com medo. Estão preocupadas com a água, se a água do mundo vai acabar ou vai ficar toda poluída. Pensam no que a gente pode fazer para melhorar, mas existe, sim, esse receio.
ANA PAULA YAZBEK
Formada em pedagogia, especialista em educação de crianças de zero a três anos e mestre em educação pela Faculdade de Educação/USP, atua em pesquisa sobre o papel dos educadores de crianças de 0 a 3 anos. É fundadora do Espaço da Vila, atual espaço ekoa, escola na zona oeste de São Paulo.
Quando falamos de crianças, a sociedade é praticamente uma entidade abstrata. A sociedade e a cultura funcionam muito, mas qual é a sociedade real da criança, para além da família? A escola. Onde os meninos e as meninas ouvem coisas diferentes do que escutam em casa? Na rua já nem vão muito...
Isso [um evento como a pandemia] impacta a criança dessa idade, porque a morte não é uma coisa que figura no dia-a-dia [da criança em condições normais]. Sabem que, quando se fica velho, morre. E só. Mas aparece uma catástrofe como a pandemia e elas viram que as crianças morriam também. A morte chegou perto deles e isso, na estruturação psíquica, dá um buraco. Isso desestrutura absolutamente.
LEONARDO POSTERNAK
Formado em Medicina e em Psicanálise, é presidente-fundador do Instituto da Família, entidade que trabalha com famílias em situação de vulnerabilidade. É autor de “O direito à verdade – Cartas para uma criança”, vencedor do Prêmio Jabuti 2003.
As crianças hoje, elas estão ou dentro das casas ou elas estão nas escolas. Quando você entra numa escola que a professora fica gritando, como é que eu vou dizer para você que não se pode ser violento, se eu sou violento o tempo todo? Uma sala com 40 crianças você não vê um professor (que não grita). Claro que existem raríssimas exceções, mas para manter o controle de 40, você grita e você vai falar de paz.
Uma das coisas que me chamou atenção é que as crianças estão trazendo os mesmos dilemas que o mundo todo está tratando. E a questão da violência, ela é muito forte. Quando você lista as temáticas apresentadas, o negativo aparece mais. Uma coisa que eu senti é que se fala muito pouco do brincar.
LUCILENE SILVA
Mestre e doutoranda em música na UNICAMP, membro do Conselho Diretivo do Grupo ICTM de Música e Dança da América Latina e Caribe, é pesquisadora de Cultura Infantil e Música Tradicional da Infância, tendo percorrido cerca de 160 municípios brasileiros e de outros países da América Latina.
O nível de consciência das crianças sobre as questões fora do universo mais próximo, de cada uma delas, em qualquer classe social, começa a ficar maior. Elas se preocupam por temas mais globais mesmo.
TERESA REGO
Professora Titular da Faculdade de Educação da USP (FEUSP), pedagoga especialista em psicologia infantil e pós-Doutora pela Sorbonne-Université Paris Descartes, França. Possui experiência de mais de 30 anos em assessorar equipes de criação voltadas à produção de conteúdos infantis.
O pedagogo italiano Francesco Tonucci, fundador da Rede Mundial Cidade das Crianças, questiona se as crianças não estão na rua porque a cidade é perigosa ou a cidade é perigosa porque as crianças não estão na rua.
URSULA TRONCOSO
Arquiteta e urbanista, especialista em Arquitetura, Educação e Sociedade. Desde 2016 desenvolve o projeto Cidade para Crianças, que leva educação espacial e discute o ambiente urbano com crianças e jovens.
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O que podemos fazer a respeito
O mundo que sei é uma iniciativa criada por adultos que, desde a primeira troca de ideia entre os criadores, teve como ambição trazer as crianças para o centro do debate sobre a contemporaneidade.
Mas não no lugar de objeto. A intenção sempre foi diminuir a estatura do ouvinte para elevar o nível do debate. Ou seja: nos dobramos e vamos continuar nos dobrando para podermos escutá-las bem de perto e com atenção. O que descobrimos até aqui não foi um alento. Estamos atentos, preocupados e, sobretudo, motivados a usar tudo isso para continuar o trabalho de escuta. Temos também a ambição de aproveitar nossos achados para abrir diálogos familiares, escolares e em outras esferas públicas. Desejamos ainda que essas conversas ganhem amplitude e contribuam para a criação de iniciativas capazes de construir um planeta mais tranquilo, saudável e justo para todos e todas.
Ficha técnica
Direção geral
Paula Guedes
Fabio Guedes
Henry Grazinoli
Giuliana Bergamo
Direção de conteúdo e pesquisa
Giuliana Bergamo
Assistente de conteúdo e pesquisa
Beatriz Carrera
Coordenação da pesquisa etnográfica
Adriana Friedmann
Pesquisa etnográfica
Ariela Kalili
Gabriel Douek
Linda Peixoto
Massumi Guibu
Glaucia Sales Paes Fernandez
Pesquisa quantitativa e qualitativa
Studio Ideias
Gerência de projetos
Leonardo Belquiman